Revista Oficial do Núcleo de Estudos da Saúde do Adolescente / UERJ
NESA Publicação oficial
ISSN: 2177-5281 (Online)
Artigo Original | Imprimir ![]() Páginas 70 a 79 |
Autores: Isabel Ayres Pereira1; Andreia Ribeiro2; Cátia Vilas Boas Leitão3; Ana Catarina Maia4; Isabel Carvalho5; Ana Sofia Garrido6 1. Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia e Espinho, Serviço de Pediatria - Vila Nova de Gaia - Portugal Maria Isabel Pereira Submetido em 28/12/2018 ![]() ![]() Descritores: Trombose Venosa; Adolescente; Fatores de Risco; Trombofilia.
Resumo:
INTRODUÇÃO
Apesar de raro na idade pediátrica, o Tromboembolismo venoso (TEV) tem uma incidência crescente e está associado a morbilidade e mortalidade significativas1,2. A sua etiologia na idade pediátrica é multifatorial e inclui fatores de risco (FR) hereditários e adquiridos, cuja identificação é crucial para a otimização da abordagem terapêutica e estratégia de prevenção de complicações e recorrência2,3,4,5. No entanto, a escassez de estudos dificulta a elaboração de protocolos de atuação, sendo a maioria das recomendações extrapoladas dos adultos, com as limitações inerentes1,2. O objetivo deste trabalho é a análise descritiva clinico-epidemiológica dos casos de Trombose venosa profunda (TVP) dos membros inferiores, de pacientes internados no serviço de Pediatria de um hospital Português, entre 2004-2016. MÉTODOS Estudo observacional retrospetivo longitudinal dos casos de TVP aguda dos membros inferiores (MI), em crianças com idades compreendidas entre um mês e 17 anos e 365 dias de idade, internadas no Serviço de Pediatria de um hospital Português entre janeiro de 2004 e outubro de 2016. Os casos foram pesquisados através da codificação ICD-10 para trombose venosa, sendo selecionados os casos de trombose venosa profunda dos membros inferiores nessa faixa etária. Os dados clinico-epidemiológicos foram extraídos retrospetivamente através do processo eletrónico individual de cada doente, mantendo o anonimato. Foi incluída a sua evolução clínica até julho de 2017. Analisaram-se variáveis demográficas, história pessoal e familiar de TEV e de trombofilia hereditária, tabagismo, medicação habitual, doenças prévias, história de trauma, cirurgia ou imobilização recentes (até três meses antes da admissão), clínica de TVP, índice de massa corporal, exames laboratoriais e imagiológicos, e tratamento e evolução ate à data. Foi utilizado o SPSS v20. na análise dos dados, sendo avaliadas frequências, médias e medianas de acordo com as variáveis em estudo. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética do Hospital em causa. RESULTADOS Identificaram-se oito casos, cujas principais características se encontram enunciadas na tabela 1. Todos ocorreram em adolescentes (idade mínima 14,25 anos; média de idades de 16,37 +/- 3,99 anos), sendo 75% do sexo feminino. Em todos os casos foi identificado mais de um fator de risco (FR) e em 87,50% mais de dois FR para TEV, cuja distribuição por sexo se observa na figura 1 abaixo. Globalmente destacam-se: utilização de anticoncecional oral (ACO) (100% das adolescentes), história familiar de TEV em familiar do 1º grau (37,5%), trombofilia hereditária "majo" (37,5%), imobilização (25%) e tabagismo (25%; sendo 25% sem registo); um caso (12,5%) ocorreu num adolescente com Síndrome anti fosfolipídica (SAFL) e episódios prévios de TVP, hipocoagulado com varfarina, mas com INR subterapêutico à admissão (INR 1,45); identificaram-se casos isolados de infeção aguda e obesidade. ![]() Figura 1. Gráfico resumo dos FR para TEV identificados na amostra e sua distribuição por sexo. Os ACO eram utilizados há menos de um ano por todas as adolescentes, com média de 5,5 meses (DIQ 1,63-7,5); todos eram ACO combinados: 66,70% de 3ª geração (gestodeno) e 33,3% de 4ª geração (acetato de ciproterona). A apresentação da TVP foi unilateral em 100% dos casos (75% no MI esquerdo). O tempo médio de evolução até ao diagnóstico foi de 2,18 +/- 1,46 dias (mínimo 12 horas, máximo 5 dias), e os sintomas mais reportados foram a dor (100%), a alteração do volume do membro (75%) e a limitação funcional (37,5%). Objetivamente, destacam-se o edema e a dor à palpação da área afetada (87,5%), a limitação na mobilidade e a diminuição dos pulsos (37,5%). A alteração da cor do membro ocorreu em dois casos (25%), e ocorreu um caso isolado com calor e outro com sinal de hommans positivo. A ecografia com doppler confirmou o diagnóstico de TVP proximal (atingimento dos segmentos ilíaco, femoral ou poplíteo) em todos os casos, sendo considerada extensa (ílio-femoro-poplítea) em 75%; a oclusão foi total em 25%, parcial em 25% e mista em 12,5%. A investigação laboratorial com hemograma, estudo da coagulação, função renal, ionograma, glicose, TGO/TGP e proteína C reativa (PCR) foi realizada em todos os casos à admissão, ocorrendo após a 1ª dose de heparina de baixo peso molecular (HBPM) em 37,5%. Foi identificada leucocitose ligeira em 12,5%, neutrofilia ligeira em 50%, e elevação da PCR em 62,5%. Verificou-se diminuição do INR, aumento do aPTT ou PT nos casos já sob anticoagulação e nos casos associados a mutação da protrombina (PT) e défice da PS. Os D-dímeros foram requisitados na fase aguda em 75% dos casos, revelando-se aumentados em 83%. Os anticorpos antifosfolipídicos estavam normais em todos os casos. Em todos casos foram pesquisadas trombofilias hereditárias major na fase aguda (Tabela 2), identificando-se defeitos trombofílicos major em 37,5%: n=1 mutação do FVL em heterozigotia, n=1 mutação PT G20210A em heterozigotia, e n=1 défice de PS com mutação no gene PROS 1 em heterozigotia. Todos os casos iniciaram dupla anticoagulação com HBPM (1mg/Kg 12/12h via subcutânea) e varfarina (0,2mg/Kg/dia via oral), mantendo-se a primeira por cinco dias e, até INR terapêutico, dois dias consecutivos (mediana nove dias (DIQ: 5,5-12)). A mediana do tempo de internamento foram 11 dias (DIQ 6,25-12,75), e todos tiveram alta com varfarina. A duração total do tratamento variou entre 6-41 meses, mantendo-se à data da última avaliação em três casos. Em nenhum caso foram verificadas complicações associadas ao tratamento. Para além do tratamento farmacológico, todos iniciaram meia de contenção elástica no internamento, 37,5% mobilizaram precocemente o membro e os ACO foram suspensos. Em relação às complicações agudas, foram identificados à admissão dois casos de TEP em adolescentes do sexo feminino (25%). Não ocorreu nenhuma morte, hemorragia, recorrência precoce, ou insuficiência venosa aguda do membro. A angioTC torácica foi realizada à admissão em 37,5% dos casos, confirmando TEP em um caso sintomático e um caso assintomático com extensão intra-abdominal da TVP, e excluindo-o no adolescente sem clínica sugestiva, mas com SAFL e TVP prévia. Em ambos os casos o TEP era bilateral, afetando três ou mais vasos em ramos lobares/segmentares, e num caso as artérias pulmonares principais. Os sintomas referidos foram a dor torácica, a dispneia e a tosse. À data de alta, todos os casos foram orientados para a consulta de imuno-hemoterapia e cirurgia vascular, e 50% foram orientados para a consulta de pediatria. O tempo médio de seguimento na consulta de cirurgia vascular foi de 17,75 +/- 3,16 meses. Aos 12 meses, um caso apresentou sintomas e sinais de Síndrome pós-trombótico (SPT) (edema e vasos colaterais no membro afetado) e a TVP recorreu no membro contralateral no adolescente com SAFL, com INR terapêutico (2.4). DISCUSSÃO Depois do período neonatal, a adolescência constitui o segundo pico da distribuição etária do TEV pediátrico, com uma incidência estimada de 1,1/10000 adolescentes/ano1,2,6,7,8, cerca de três vezes superior ao restante da população pediátrica9. Apesar de raro, a sua incidência tem aumentado devido à melhoria dos cuidados a crianças criticamente doentes, o uso mais frequente de procedimentos invasivos, a melhoria das técnicas de diagnóstico, e ao maior alerta para esta patologia1,4,5,6,7,8,9,10. Esta tendência parece mais expressiva na adolescência, para a qual está descrito um incremento de 49% na prevalência de TEV entre 2001-200711. Nesta faixa etária, o tabagismo, os ACO, e a gravidez são fatores adicionais para este fenômeno3, e por isso mais prevalente no sexo feminino (incidência de 1,49 vs 0,81/10000 adolescentes/ano no sexo masculino)1,2,4. Ao contrário dos adultos, em que 40% do TEV é idiopático4,6, na idade pediátrica ele é habitualmente multifatorial, estando descrito ≥1 FR em 90% 2 e apenas 0-5% dos casos idiopáticos4, tal como nesta amostra. Depois do cateter venoso central, responsável por 50-60% do TEV na idade pediátrica, as doenças crônicas são o FR adquirido mais prevalente (70%), destacando-se a doença cardiovascular, a neoplasia, a doença neuromuscular, a síndrome nefrótica, e os estados inflamatórios crônicos, como a doença inflamatória intestinal e a artrite reumatoide3,5,9,12. Na adolescência, por sua vez, as condições agudas - como infeção/sépsis, trauma/cirurgia major com imobilização prolongada, desidratação e gravidez/puerpério -, e a utilização de ACO, a obesidade, o sedentarismo e o tabagismo parecem assumir particular importância1,3,4,7,8,11, tal como representado na população estudada. Os anticorpos antifosfolipídicos (lúpus anticoagulante, β2 microglobulina e anticardiolipina), presentes de forma isolada no SAFL primário ou no contexto de doença sistêmica, como no Lúpus eritematoso sistêmico, aumentam significativamente o risco de TEV e sua recorrência, devendo ser pesquisados de forma sistemática em todos os casos3,12. Os ACO, representados de forma significativa nesta amostra, aumentam cerca de 3-4 vezes o risco de TEV, com incidência de 1:12500/mulheres/ano sem ACO vs 1:3500/mulheres/ano com ACO6,12. O risco parece superior nos primeiros 6-12 meses de tratamento6 e é 2-4 vezes superior para os de 3ª e 4ª geração em relação aos de 2ª geração6,13. A coexistência de outros FR como o tabagismo, a mutação do FVL, a obesidade e a cirurgia major, aumentam substancialmente este risco7,11, estando presentes em 50% das adolescentes. Neste contexto, foram desenvolvidas orientações práticas para a sua prescrição. Estas contraindicam os ACO combinados se TEV agudo ou prévio, história pessoal/familiar de trombofilia hereditária e/ou cirurgia com imobilização prolongada, sendo os ACO progestativos e o dispositivo intra-uterino (DIU) com progestativo uma opção de menor risco, e considerado seguro apenas o DIU de cobre. Nos casos assintomáticos com história familiar (1º grau) de TEV os ACO combinados/progestativos poderão ser utilizados embora seja preferido o DIU cobre/progestativo. Em mulheres obesas é desaconselhada a contraceção com estrogênios, devendo ser preferidos ACO progestativos ou DIU14. Para além disso, é recomendada a suspensão de ACO pelo menos quatro semanas antes de cirurgia major com imobilização prolongada2, o que não ocorreu no caso da nossa amostra. Os defeitos trombofílicos hereditários ocorrem em cerca de 10-78% do TEV pediátrico2. Apesar de aumentarem o risco de TEV e sua recorrência, a sua identificação não afeta a abordagem aguda do mesmo2,5, e o risco global conferido é muito baixo (0,07/100000 crianças/ano), dependendo do defeito em causa, e não parece ser significativo na ausência de outros FR adquiridos2,12. No entanto, a potencial implicação no tempo de tratamento, na profilaxia anti-trombótica em situações de risco, no esclarecimento da situação aguda, e no aconselhamento familiar e de estilos de vida saudáveis, parece justificar a sua pesquisa sistemática nos casos não provocados, particularmente na adolescência2,10,11,12,15,16. Os defeitos trombofílicos hereditários mais comuns são a mutação do FVL e a mutação do gene da PT G20210A, presentes respetivamente em 5% e 2% dos caucasianos. O défice de PC, PS e ATIII são mais raros e associam-se a um risco mais elevado de TEV e recorrência15. A elevação do fator VIII e a hiperhomocistieinemia podem ser hereditárias ou adquiridas e aumentam também esse risco 2,3,9. Exceto as mutações genéticas e o FVIII, cujo aumento na fase aguda e pós tratamento tem valor prognóstico, a restante avaliação deverá ser protelada para evitar falsos positivos relacionados com a fase aguda da doença e tratamento6,12,16, como ocorreu nesta amostra. Foram identificados defeitos trombofílicos hereditários em 37,5% dos casos, todos associados a FR adquiridos, o que está de acordo com a literatura10. Apesar de frequentes na população em geral, o risco de TEV associado às mutações MTHFR e PAI-1 isoladamente não está comprovado, não sendo recomendada a sua pesquisa por rotina16. A história de TEV em familiares de 1º grau estava presente em 37,5% dos casos e constitui um FR independente para TEV, salientando a importância desse dado na colheita da história clínica6. A fisiopatologia multifatorial do TEV e o perfil de FR identificados nesta amostra salientam assim a importância da sua avaliação sistemática nas consultas de rotina a adolescentes, particularmente no planeamento de situações de risco como internamento e/ou cirurgia maior com imobilização, e nas candidatas a ACO3. Nesta população, uma abordagem antecipada e adaptada ao risco poderia ter conduzido a uma mudança de atitude e eventualmente do risco de TEV em 37,5% dos casos, a não prescrição de ACO em adolescentes obesas, fumadoras ou submetidas a cirurgia maior e/ou imobilização prolongada, bem como a profilaxia antitrombótica prolongada nas últimas. Em relação à clínica, a apresentação unilateral da TVP com predomínio do segmento proximal do MIE está de acordo com a literatura6, assim como a sintomatologia e o tempo médio até ao diagnóstico1. A ecografia com doppler é o exame de diagnóstico recomendado, permitindo ainda avaliar extensão e o grau de oclusão e controle no follow-up2,6. O hemograma e estudo da coagulação estão preconizados antes do início do tratamento para despiste de distúrbios da coagulação evitando os falsos negativos associados á terapêutica2, como verificado nos três casos em que a colheita ocorreu nessas condições. Para além dos anticorpos antifosfolipídicos, a avaliação bioquímica básica é indicada para excluir patologia sistêmica que possa estar na base do TEV e para orientar a escolha do anticoagulante2, tendo sido normal em todos os casos. A elevação da PCR em 62,5% dos casos, apenas um dos quais com infeção comprovada, poderá relacionar-se com o estado de inflamação local e sistêmico associado à TVP. A maioria das recomendações atuais de tratamento da TVP na idade pediátrica é extrapolada dos adultos, com as limitações inerentes2,3,5,6. Os objetivos são o alívio sintomático, a promoção da resolução do trombo e a prevenção da sua extensão, embolização, recorrência e complicações2,6. O regime de primeira linha preconizado é a HBPM (1mg/Kg 12/12h) dada a sua elevada biodisponibilidade, estabilidade sanguínea e utilização subcutânea, com menor necessidade de monitorização laboratorial2,6. Esta deve ser iniciada com a varfarina (dose inicial 0,2mg/Kg oral), mantendo-se a combinação no mínimo cinco dias e até INR entre 2-3 dois dias consecutivos2,6. Na população adolescente, a frequente má adesão ao tratamento, a medicação habitual concomitante, as variações na dieta, e o consumo ocasional mas potencialmente pesado de álcool, podem dificultar o controle dos níveis de anticoagulação com varfarina. Assim, enquanto a eficácia e segurança das novas terapias orais (ex.inibidores diretos do fator Xa) não são comprovadas em idade pediátrica, estes são aspectos a ter em particular atenção na sua vigilância regular1,3. O tempo de tratamento depende da etiologia2,5,15. Para a TVP no contexto de FR reversíveis estão recomendados 3-6 meses de anticoagulação2,3,5,15. Na nossa amostra dois casos realizaram mais de 12 meses tendo em conta fatores clínicos e epidemiológicos, salientando a importância de uma decisão caso-a-caso e baseada na experiência. Dado o risco aumentado de TEV e da sua recorrência ao longo da vida, o SAFL é considerado uma trombofilia major que preconiza anticoagulação indefinida2,3,5,12,15, como nesta amostra. Quando o TEV ocorre no contexto de um FR irreversível está preconizada anticoagulação indefinida, sendo que se idiopático esta deverá ser mantida 6-12 meses3. No contexto de TEP é aconselhada anticoagulação seis meses3. Dado o papel ainda pouco esclarecido da trombofilia hereditária no risco de TEV e sua recorrência, o tempo de anticoagulação nesse contexto não está formalmente definido e poderá depender do defeito em causa e da presença concomitante de outros FR10,12. Assim, dado existirem em heterozigotia, os casos associados às mutações dos genes da PT e FVL realizaram seis meses de tratamento. Para o caso associado a déficit de PS, dado o maior risco de recorrência e sua coexistência com tabagismo persistente e história de TEV familiar, foi decidido manter o tratamento indefinidamente. Em nenhum caso foram verificadas complicações do tratamento, reforçando a segurança destes fármacos na idade pediátrica3. Para além do tratamento farmacológico, outras medidas gerais são recomendadas para prevenir a recorrência precoce e complicações tardias de TVP, destacando-se a mobilização precoce do membro afetado e deambulação, e a utilização de meia de contenção elástica para alívio sintomático3,6. Nesta amostra, a deambulação e mobilização precoce do membro afetado ocorreram em apenas 37,5% dos casos, sendo uma importante medida à reforçar. Por outro lado, embora todos os casos tenham iniciado meia de contenção elástica durante o internamento, não foi possível aferir a sua utilização a longo prazo em 37,5%, e em um caso a adesão foi esporádica. Apesar da prevalência de TEP como complicação de TVP estar de acordo com a literatura (16,0-31,0%), ela pode estar subestimada já que a sua pesquisa não foi sistemática. A suspeita clínica de TEP nas crianças é difícil por ser frequentemente assintomático3,17,18; para além disso, ao contrário dos adultos, a utilização dos D-dímeros e escores para determinação da probabilidade pré-teste de TEP não estão comprovados na idade pediátrica1,2,3,17,18. Assim, o seu diagnóstico continuará a exigir um elevado índice de suspeição e a depender de fatores clínicos, imagiológicos e da experiência da equipe18. O SPT e a recorrência são as principais comorbilidades associadas a TVP, revestindo-se de particular importância na idade pediátrica devido à maior esperança de vida após evento com potencial incapacidade e deterioração da qualidade de vida na idade adulta5. Assim, a identificação e modificação dos FR para as mesmas, e o seu diagnóstico precoce e tratamento precoce são cruciais nas consultas de seguimento19. A recorrência do TEV pediátrico é estimada entre 5-10%2,5,8, sendo maior nos adolescentes (19-22%)4,5,7,11 e nos casos idiopáticos15. Além disso, depende do tempo de seguimento e grau de oclusão4. Nesta amostra, ela ocorreu no caso de SAFL (12.5%) um ano após o evento índice, que mantinha hipocoagulação embora em níveis terapêuticos. O SPT é a complicação crônica mais comum de TVP e caracteriza-se por insuficiência venosa crónica do membro afetado5,19. Tem uma prevalência estimada de 10-70% (média ponderada 26%)2,15,19, sendo leve-moderado na maioria dos casos2,19. O maior número de vasos afetados, maior tempo de seguimento após TVP, oclusão completa de veia, elevação de D-dímeros e fator VIII ao diagnóstico e após anticoagulação, e a não resolução completa ou extensão do trombo parecem aumentar o risco de SPT19. A sua fisiopatologia pressupõe alterações crônicas vasculares não devendo a clínica confundir-se com a sintomatologia da fase aguda; assim, o diagnóstico pressupõe a sua presença em duas avaliações com pelo menos três meses de intervalo e (6)12 meses após o evento inicial20. A sua pesquisa deve ser feita em cada consulta de seguimento através da aplicação de uma das duas escalas validadas e modificadas para a idade pediátrica - Escala de Villalta modificada e Instrumento de Manco-Johnson20. Na amostra estudada apenas um caso apresentou algum sinal/sintoma de SPT, reforçando o seguimento regular a longo-prazo. A orientação dos doentes à data de alta salienta a importância do seguimento em consulta de imunohemoterapia para controle da anticoagulação, de cirurgia vascular para avaliação da resolução do trombo e vigilância regular de complicações, e de Pediatria para uma centralização e abordagem holística de cada caso com aconselhamento e intervenção nos FR modificáveis. O seguimento em consulta de Pneumologia dos casos de TEP é importante na vigilância de complicações como hipertensão pulmonar. REFERÊNCIAS 1. Biss TT. Challenges in adolescent venous thromboembolism. Lancet Haematol 2016;3:e264-6. 2. Chalmers E, Ganesen V, Liesner R, Maroo S, Nokes T, Saunders D, et al. Guideline on the investigation, management and prevention of venous thrombosis in children. Br J Haematol 2011;154:196-207. 3. Radulescu VC, D'Orazio JA. Venous Thromboembolic Disease in Children and Adolescents. Adv Exp Med Biol 2017;906:149-65. 4. Ishola T, Kirk SE, Guffey D, Voigt K, Shah MD, Srivaths L. Risk factors and co-morbidities in adolescent thromboembolism are different than those in younger children. Thromb Res 2016;141:178-82. 5. Kerlin BA. Current and future management of pediatric venous thromboembolism. Am J Hematol 2012;87 Suppl 1:S68-74. 6. Sequeira AI BM, Teles A, Costa M, Sousa B, Ramalho H. 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